sábado, 25 de julho de 2020

“CADERNO DE VIAGEM”, UMA AVENTURA LITERÁRIA: DE JOSÉ ROBERTO GARBIN E EDUARDO WAACK



Nos anos 70, eu e meu parceiro musical íamos de carona participar de festivais de música pelo interior do estado do Rio de Janeiro, com algumas incursões por Minas Gerais. E ao sabor de um baseado e alguns chás de cogumelos (éramos jovens e se os Beatles usavam, por que nós não usaríamos?) subíamos no palco e levávamos, na maioria das vezes, um troféu para casa. Hoje, mais de quarenta 40 anos depois de tomar juízo e decidir se tornar um careta a base de água mineral, recebo o livro “Caderno de viagem”(Edições O Boêmio) de José Roberto Garbim e Eduardo Waack que, tomando Coca-Cola seguiram rumo “Brasil, Argentina e Paraguai de carona” numa viagem inesquecível, dessas que o leitor após a última página, sente inveja de não ter sido o protagonista dessa história.
Essas lembranças foram transportadas para as páginas de um livro, a partir do diário de José Roberto Garbim e ao qual foram agregadas as memórias e observações de Eduardo Waack), que narram à aventura de 25 dias de dois adolescentes residentes em matão, interior paulista, prestes a alistar-se no serviço militar obrigatório (do qual se safaram) e com a cara e a coragem, foram como Jack Kerouac no clássico “On The Road”, correr estrada afora.
“O ano de 1981 de sonhos e planejamento. Em março, numa noite regada à cerveja na Lanchonete Jandaia, ponto de encontro da juventude matonense, entre o final dos anos 1970 e inicio dos anos 1980, combinamos de fazer uma viagem de carona pelo sul da América do Sul. O projeto inicial previa Brasi, Uruguai, Argentina Chile e Paraguai, mas a realidade nos permitiu fazer uma versão reduzida da planejada, envolvendo Brasil, Argentina e Paraguai. (...)”
A saga inicia-se em Matão, cidade na qual moravam (e ainda moram), passando por Pato Branco, Eldorado, ambos estado do Paraná; indo direto para San Ignacio, Posadas, na Argentina; Fernando de La Mora, Paraguai; voltando pelo Paraná via Foz do Iguaçu, Pato Branco, Curitiba; chegando a capital paulista e encerrando em Porto Feliz, ambos estado de São Paulo. Nessa aventura, ficando algumas vezes em casa de amigos, também fizeram novos amigos.
Para compreender a narrativa deste livro é preciso situar-se em seu momento histórico: início dos anos 1980. A América Latina vivia sob o domínio do medo, com ditaduras sufocando as instituições e suprimindo as garantias individuais. Brasil, Argentina e Paraguai, apoiados pelos Estados Unidos, não eram exceções. No Paraguai, o general Alfredo Stroessner instaurou em 1954 um regime marcado pela brutal repressão popular. Em 1964, no Brasil, os militares depunham João Goulart, tomando o poder, levando o nosso país a torturas e mortes de quem era contra o regime. Na Argentina, um feroz golpe em 1976 fez surgir um regime militar que causou a morte de milhares de pessoas, e o desaparecimento de tantas outras. Era arriscado ser diferente e as pessoas tinham medo da própria sombra. A democracia só voltaria ao nosso país, em tese, em 1984.
“Caderno de viagem” leva o leitor a uma viagem divertida, onde os autores revelam encontro com amigos e o inicio de novas amizades, difícil nos dias de hoje, com a violência não velada como naquela época, mas escrachada aos extremos para quem quiser sentir receio. É um livro que se lê numa sentada só e que nos faz sentir aquela vontade de voltar à primeira página.
“Caderno de viagem” tem ilustração da capa por Fabrício Lima, apoio cultural de Garbeer Cerveja Artesanal, empresa que merece destaque por acreditar na cultura e vem ilustrado com fotos da viagem e poemas de Eduardo Waack e é um livro que nos leva a viver junto aos autores, essa fantástica aventura. Vale ler e se aventurar nas páginas desse livro, que eu recomendo.
Contato com os autores: jrgarbim@gmail.com e eduardowaack@gmail.com

quarta-feira, 1 de julho de 2020

POESIA NO CÉU – HOMENAGEM*



Dia 3 de abril de 2020 recebo a notícia de que a escritora, haicaista e minha amiga Tânia Diniz havia partido. Lutou muito (por muitos anos) para permanecer entre nós, mas o chamado do céu foi maior, afinal, como negar quando se precisa de poetas no Paraíso?! A principio achei que seria um primeiro de abril atrasado, nesses tempos de fake news, mas não: para minha tristeza, era a mais pura verdade. Dia 31 de outubro de 2019, dia do poeta, recebi um WhatsApp dela que dizia o seguinte: “Sonhei com você hoje. Me ajudava a chegar em algum lugar...”. Como kardecista que sou, me pergunto: será que tive esse privilégio com ela?
Conheci Tânia Diniz em 1988, levada pelo poeta Márcio Almeida até a Editora Arte Quintal. Na época, eu e o poeta Wagner Torres dividíamos nossos sonhos alojados numa sala da Rua Carijós nº 150, no centro da capital mineira. E assim tive o privilégio de ser seu primeiro editor, quando publicamos seu livro de estréia “O Mágico de Nós.
Em 1989 fiquei sabendo que ela estava criando um jornal-mural junto com a poeta e musicista Lívia Tucci intitulado “Mulheres Emergentes- O sensual em cartaz”. Era um jornal de tendência feminista, porém, acreditem ou não, era aberto a publicações masculinas, sem revanchismos e preconceitos. Ali descobri que Tânia Diniz estava à frente do seu tempo.
E o “Mulheres Emergentes- O sensual em cartaz” ganhou o mundo, alcançando reconhecimento internacional, tendo a admiração de escritores renomados de vários países, além do Brasil, entre eles, Sonia Palma, residente na Inglaterra, que comentou em 2019, quando o “Mulheres...” comemorava 30 anos de resistência: “(...) Meu olhar vê uma beleza incontestável nesse espaço: a beleza da garra feminina, da luta de uma mulher que ano após ano, vem fazendo de seu espaço, seu mural poético, um lugar de reunir o talento de mulheres que usam a palavra como forma de expressão de suas lutas e conquistas, amores e desamores, alegrias e tristezas. Minha grande admiração por você, Tânia Diniz.”
E eu lhe fiz uma merecida homenagem em 2007, no “3º Belô Poético – Encontro Nacional Poesia”, evento criado e realizado por mim e Virgilene Araújo, em Belo Horizonte. Em 2008 a convidei para participar, junto com Lívia Tucci, do projeto “Poesia na Praça Sete”, realizado também por mim e Virgilene Araújo, com o patrocínio da Lei Municipal de Incentivo a Cultura. E ali, em plena rua, lugar onde a poesia realmente deveria sempre estar, ela nos mostrou todo o seu potencial.
Ano passado, Tania Diniz foi merecidamente homenageada pela Câmara Municipal de Belo Horizonte, através do vereador Pedrão do Depósito, pelos serviços prestados a literatura brasileira.
Durante os 32 anos que mantivemos nossa amizade, sempre pude notar o amor que ela nutria pelos seus amigos, e neles eu me incluo. Pessoa simples, nunca negou uma palavra de carinho a quem lhe procurava. Nesse mundo de vaidades e arrogâncias artísticas, no qual muitos escritores se acham deuses, Tânia Diniz há de fazer muita falta, sobretudo pelo ser humano que foi, enquanto esteve entre nós.

*OBS: esse texto seria publicado ainda em abril neste blog, mas por questões de problemas com a internet e a quarentena, só agora pode vir a público.