E eis que 2018 chega a seu final com
lançamentos expressivos na literatura brasileira. E como um bom leitor, que
sou, li muitos livros ao longo do ano, mas dois se destacaram nessas minhas
leituras. O livro da escritora Dalva Silveira e o do antropólogo e escritor
Romeu Sabará.
“De Realidade a Caros Amigos: a Turma
do Ex-, imprensa alternativa e seu legado” (Grupo Editorial Letramento) foi
para mim, uma fonte de conhecimento, daquilo que eu não conhecia. O livro nos
fala da imprensa alternativa, principalmente da turma da revista “Ex” um
grupo de jornalistas que, em 1968, foram cerceados pela repressão militar e,
através de uma demissão coletiva, saíram da revista Realidade (Editora Abril),
se uniram e, em 1970, juntamente com outros jornalistas criaram O Bondinho,
Grilo e Ex-. Nesse último, publicariam a primeira matéria sobre Geraldo Vandré,
depois de sua volta do exílio e a única reportagem a respeito da morte de
Vladimir Herzog, ocorrida em outubro de 1975, o que acabou provocando o
fechamento do jornal. O livro aborda muito mais do que apenas a revista “Ex”,
fala de uma parte obscura da nossa história, que muitos querem negar: vivemos
sim, uma ditadura sem liberdades em todos os seus aspectos gerais e restritos.
É um livro urgente para
quem não se situa nessa história
recente do país e em sua fraqueza, busca uma intervenção militar no Brasil,
numa maneira covarde de não encarar que a responsabilidade de mudar é de cada
um e não de determinado grupo que a fariam em nosso nome. Dalva Silveira
publicou em 2011 “Geraldo Vandré: a vida não se resume em festivais” (Fino
Traço). Contatos: dalvasilveira@yahoo.com.br
Já em
suas “Memórias de um antropólogo
brasileiro em plena ditadura” (Chiado Books), Romeu Sabará, como
antropólogo e poeta, pesquisador e professor universitário, se aprofunda para
nos fazer entender a fragilidade da democracia no Brasil. Democracia essa que,
segundo Sabará: “existe e coexiste com um
inconsciente coletivo de cunho golpista pronto para entrar em cena, quando os
movimentos sociais avançam além dos limites que lhes são impostos.” Sem
que sua obra deixe de ser uma contribuição original para a Antropologia
Política, o autor trata do assunto de forma palatável para o cidadão comum,
articulando, no texto, a prosa e a poesia, realidade social e metáfora da
realidade. Como o autor também é poeta (e dos bons), o livro nos mostra também
poemas. A narrativa de suas memórias desdobra-se em três blocos. Na primeira
parte (1965 a 1969) fala sobre a sua opção pela antropologia e sobre sua
formação inicial como antropólogo, com todas as suas limitações. Na
segunda parte (1970 a 1984) procura estabelecer a relação estreita de causa e
efeito entre a prisão em 1973 e a sua separação conjugal e divórcio
litigioso que transcorreu entre 1972 e 1977. Na terceira parte (1985 a 1996)
disserta sobre o assédio acadêmico de que foi vítima como pesquisador e
professor de Antropologia Social, no Departamento de Sociologia e Antropologia
da FAFICH/UFMG. Nessas três partes, vêm expostos os fatos sistematizados que
fundamentaram suas reflexões antropológicas. E conclui suas reflexões
mostrando a ligação existente entre o golpe militar de 1964, que instalou a
ditadura militar no Brasil e o golpe congressual, jurídico e midiático, de
2016, que instalou o que o autor entende como sendo a nova ditadura – a
ditadura civil. Contatos: romeusabara@uol.com.br
Nenhum comentário:
Postar um comentário