segunda-feira, 9 de março de 2020

“FRONTEIRAS EM LIQUIDAÇÃO” DE RICARDO ALFAYA



Alguns livros de poesia, confesso, dão-me sono ao lê-los. Veja a poesia, mesmo a mais elaborada em sua técnica apurada, como algo que tem de ser entendível a primeira leitura. Poemas que tenho de relê-los para entendê-los, são os mais prováveis os quais não voltarei a sua leitura. Por isso, tantos livros de poemas que recebo, dou-os a bibliotecas, na certeza de que não voltarei a relê-los. Guardo em minha estante apenas aqueles que me agradam, pela sua simplicidade em dizer o que o autor pretende que o leitor entenda. “Fronteiras em liquidação” (Dowslley Editora) de Ricardo Alfaya é um desses: publicado em 2016 é uma compilação de cinco livros, que são “Passeio Público”, “Sujeito a Objetos”, “Águas-Fortes”, “Feitiços de Vento” e “Fronteiras em Liquidação”, no qual o autor publicou poemas reescritos de livros anteriores e outros inéditos.
“Fronteiras em liquidação” é um livro de poemas da mais alta qualidade, escritos com a simplicidade que todo poeta que se preze e que queira alcançar seus leitores, deveriam ser, caso de Carlos Drummond de Andrade, por exemplo, considerado poeta maior, porém entendido até pelo leitor que tem dificuldades em compreender poesia, como também nosso Manuel Bandeira. Para se ser um verdadeiro poeta é preciso ser simples, sem ser piegas e nisso Ricardo Alfaya acertou em cheio. Vejamos alguns versos: “Apenas duas letras,\que formam uma sílaba\tônica e agudo-crônica.\Pesada e angustiante,\dominadora e insolente.\Simplesmente,\Só.” ou mesmo neste poema profundamente humano: “Outro dia,\na Rua do Ouvidor,\queria tanto\alguém me ouvisse.”
“Fronteiras em liquidação” é um livro que se lê numa sentada só, com prazer de se ler poesia que mexe na alma do leitor, desses que ao alcançar a última página, bate aquela vontade de ler novamente. E quem diz: “Meu verso não tem sequer a força\para expulsar os vendilhões do templo.\Apenas vagueia à toa,\varrido pelos vendavais da rua.\Vencido, cansado de sono e cerveja.\Esbarra em portas,\resvala em palavras.\Procura visões, vestes, vozes.\E quem deseje cantar junto.\Meu verso,\pergunta a duvidar da morte.\Sombra sonâmbula,\que passeia despercebida pela vizinhança;\que desfila em meio à indiferença\das respeitáveis senhoras,\em suas idas matinais ao supermercado.”, merece ser lido e respeitado por todos, mesmo aqueles não muito chegados à poesia.
Ricardo Ingenito Alfaya nasceu no Rio de Janeiro em 8 de agosto de 1953. Seus primeiros textos publicados no final dos anos 70 foram resenhas para o órgão “Informativo”, da Fundação Getúlio Vargas, seguidos de artigos, alguns assinados, para o tablóide “Perspectiva Universitária”, da Fundação Mudes. Faz poesia visual, tendo participado de inúmeras exposições, no Brasil e no exterior, desde 1990. Além deste “Fronteiras em liquidação”, publicou quatro outros livros de poesia. Em sua carreira literária, obteve 36 prêmios literários.
“Fronteiras em liquidação”, livro que recebeu o “Prêmio Diretoria da UBE-RJ” em 2016, é um livro que estará sempre em destaque na minha estante, entre os melhores livros que pretendo reler e que com certeza, merece ser lido por todos aqueles que buscam poesia autêntica, numa época tão difícil de entender a própria vida.



sexta-feira, 31 de janeiro de 2020

MEU LIVRO PELA COSTELAS FELINAS







Entrei 2020 com bons fluidos e novidades. É que completei 66 anos dia 6 de janeiro e comemoro 45 anos de carreira poética, iniciada nos idos de 1975 em minha terra natal, Campos dos Goytacazes-RJ. E uma das coisas boas e importantes na minha carreira está o livro “Envolver na criação”, com uma tiragem de 50 exemplares, pela Edições Costelas Felinas, de São Vicente-SP e que será uma compilação dos 45 poemas que mais gostei de ter escrito ao longo de minha longa estrada, com capa do artista plástico Vander Lúcio. Venho acompanhando a trajetória bem sucedida dessa Editora e o que ela tem feito pelo autor iniciante. 
A Costelas Felinas é uma editora liderada por Cláudia Brino, poeta e diagramadora da editora, que também edita a revista poética Cabeça Ativa, com vários livros lançados; e Vieira Vivo, poeta, letrista, co-editor e encadernador da Editora e também editor da Revista  Cabeça Ativa, membro, nos anos 80, do Grupo Picaré e atual membro do Clube de Poetas do Litoral - CPL e da IWA - International Writers Association. 
Atualmente, uma das editoras mais respeitadas do país, a atividade das Edições Costelas Felinas é unicamente a publicação de livros artesanais. São livros feitos à mão, impressos, dobrados, costurados, encadernados, refilados e finalmente entregues. Segundo Cláudia Brino, primeiramente eles criaram a revista Cabeça Ativa, que tem a proposta de, trimestralmente, editar uma “mini-antologia” com temas específicos, unindo poetas alternativos, consagrados e estrangeiros num mesmo contexto informativo. A revista é voltada para assinantes (e eu sou um deles).
Segundo Cláudia Brino: “A ideia surgiu com a decepção de ver meu primeiro livro, publicado pela Editora Scarpitta de São Paulo, muito mal elaborado, desde a feitura interna até a capa. Para não ficar desestimulada, resolvi aprender encadernação para fazer meus próprios livros e foi exatamente o que fiz. E mesmo com a dificuldade do material, na época bem mais caro e também de difícil manuseio, deu para editá-los. Somente em 2008, com a modernidade e a facilidade a favor, mas principalmente com a entrada do poeta Vieira Vivo, é que a Edições Costelas Felinas passou a ampliar seu trabalho para outros escritores/poetas. (...) Na edições Costelas Felinas eu entro com a parte de diagramação e depois nós dois fazemos a impressão e a encadernação dos livros. O mesmo ocorre na feitura da revista Cabeça Ativa. (...) Costelas Felinas era o título de um livro meu que nunca foi editado. A história era apenas de gatos e a capa era o raio x de minhas costelas. Daí o nome da editora artesanal.”
 A Edições Costelas Felinas já publicou (e continua publicando) livros de escritores de renome e importantes para a literatura brasileira, tais como Irineu Volpato e Luiz Otávio Oliani. Para mim, é um orgulho também fazer parte desse time.
Contatos com a Costelas Felinas: www.artesanallivros.blogspot.comlivroscostelasfelinas@gmail.com – (13) 98139.1967.

Fonte: pesquisa internet.


segunda-feira, 20 de janeiro de 2020

DESTAQUES LITERÁRIOS DE 2019



Em 2019 li muitos livros, mas entre tantos, três chamaram minha atenção por ser de autores iniciantes em seus livros solos, os quais muito me entusiasmou tê-los lido.
“Veros Versos” (Editora Gregory) de Francine Rodrigues. A autora inicia na carreira literária com um livro gostoso de degustar, desses que a gente lê “numa sentada só” e sente vontade de ler mais. Em “Veros Versos” lemos 29 poemas e 10 reflexões, nos quais a autora nos leva a pensar e viajar nas suas palavras, nos seus sentimentos, entre conflitos e questionamentos. Vejamos: “Saudade do que eu não lembro\invade minha vasta lembrança,\lembrança adormecida, esquecida\peito ardendo em vontade.\Vontade de fazer diferente\de viver intensamente.” Em uma afirmação, nos diz: “Somos o esboço da realidade,\cada erro, uma consequência.” Francine Rodrigues é natural de Belo Horizonte.
Escreve desde 1999. Vencedora do Concurso Nacional Novos Poetas da Vivara Editora Nacional nos anos 2016, 2017e 2018. Tem poemas publicados nos livros antologia poética da Vivara Editora Nacional. Não é preciso falar muito sobre “Veros Versos” de Francine Rodrigues, seu livro e suas palavras já dizem por si mesmo. Livro de grande sensibilidade, desses que encantam o leitor na primeira leitura. Contatos: francinecarolina@hotmail.com -  www.francinerodrigues.com.br

Nessa época em que a literatura independente leva qualquer um a publicar seu livro, sempre recebo algo novo com certo receio, já que a irresponsabilidade literária dessa nova geração deixa muito a desejar. Recebi “Todos os centros do mundo” (Editora Penalux) de Ana Paula Santos Rodrigues, de apenas 25 anos. Não li seus livros anteriores “A casa do caracol” (2010) e “Pétala no asfalto” (2011), mas este último surpreendeu-me pelo que chamo na minha concepção, de leitor, como um livro que mexeu com minha emoção, encontrando nos seus versos, idéias muito bem pensadas e por isso, versos muito bem escritos. Acredito na inspiração como fonte base para a poesia, mas a técnica apurada é extremamente necessária, com certeza e essa responsabilidade é o que não falta na autora. Dividido em três partes, o livro traz para o leitor, tanto a prosa poética, como a poesia em toda sua essência. Versos muito bem escritos e que nos passam emoção. Ana Paula Santos Rodrigues é natural de Oliveira-MG. Graduada em Ciências Sociais pela UFMG, atualmente residindo em Belo Horizonte, onde cursa o mestrado em Antropologia Social pela mesma instituição. “Todos os centros do mundo” é um livro para ser lido por quem aprecia poesia que mexe com a emoção. Contato: anapsrodrigues1@gmail.com

Marina Barreiros Mota estréia em livro solo com “Cores, Dores & Amores” (Editora Versejar), livro simples, porém feito de poemas que saem da alma da autora. Como o próprio título sugere, fala de sua própria vivência no dia a dia, por isso, um livro verdadeiro.  Sua poesia fala com a alma, de dentro de todo seu sentimento, por isso cativa. Vejamos: “No avesso dessas idas\e vindas\sou tal qual a flâmula\que tremula\ao rebuliço do vento\Giro\e suspiro cento e oitenta graus,\e me difundo\difusa\confusa\sem endereço\sem apreço\e me perco\em pontos tangentes\soturnos. Marina Barreiros Mota nasceu em Teófilo Otoni-MG. Tem participação em diversas coletâneas: É uma das autoras da coletânea “Cena Poética 5” publicada por mim. “Cores, Dores & Amores” é um livro que se lê com alma e sentimento, para pessoas sensíveis que gostam de poesia sensível, dessas que falam direto ao leitor. Contatos: marinaeng@hotmail.com

sábado, 7 de dezembro de 2019

ONDE ESTARÁ JOSÉ BOAVENTURA MALHEIRO DE CARVALHO, CIDADÃO BRASILEIRO?




O mundo perdeu no último mês de novembro de 2019, o Rabino Henry Sobel, um dos defensores dos direitos humanos na Ditadura Militar Brasileira. Quando em 1975, o jornalista Vladimir Herzog foi assassinado nas dependências do DOI-CODI pelos torturadores militares, os quais forjaram suicídio por enforcamento, Sobel não aceitou a versão de suicídio e autorizou o sepultamento no Cemitério Israelita do Butantã, seguindo os ritos judaicos (o jornalista era judeu) e não admitindo que ele fosse sepultado na ala dos suicidas. Naqueles anos de falta de liberdades, os torturadores sempre forjavam suicídio e acidentes para encobrir seus assassinatos.
Um desses possíveis assassinatos teria sido o cidadão brasileiro, José Boaventura Malheiro de Carvalho, que trabalhava vendendo jóias e por isso viajava bastante. Segundo a esposa de José Boaventura, ele tinha livros sobre Comunismo e Marxismo e era militante da esquerda, o que para época, pode ter sido um indício do seu desaparecimento ocorrido em 1972. Foram feitas pela família, várias tentativas para localizá-lo, inclusive uma viagem a Portugal, sua terra Natal. A irmã de José, localizada em Portugal por familiares, também não tinha notícias do seu paradeiro, o qual até os dias atuais ainda é um profundo mistério.
Em pesquisa no Google, a família encontrou um documento com uma ocorrência no DOPS em São Paulo, datado de 11 de maio de 1973, no qual diz que: “(...) faz saber ao réu José Boaventura Malheiro de Carvalho, filho de Antonio José de Carvalho e de Noêmia Malheiro da Luz C. da Silva, casado, branco, com 40 anos de idade, residente a Rua Av. Presidente Vargas, 134, 2ª, Belém do Pará, pelo presente edital com o prazo de quinze dias, que fica citado para comparecer no dia 28 de maio de 1972, as 10 horas na sala n. 206 de audiências desse juízo, no Palácio da Justiça, a Praça Clóvis Henrique, 2º andar, a fim de, sob pena de revelia, ser interrogado sobre acusação que lhe é feita como incurso no artigo 168 parágrafo 1º - inc. III (...)” Coincidentemente, José Boaventura Malheiro de Carvalho desapareceu misteriosamente em 1972, sem deixar possíveis vestígios. 
José Boaventura Malheiro de Carvalho é somente e apenas mais um desaparecido nos anos em que o Brasil viveu sem liberdades, sob censura até aos nossos pensamentos, nos quais uma simples suspeita era motivo para prisões, torturas e assassinatos (lembremos, por exemplo, do AI-5).
O que mais deve doer atualmente na alma dos familiares de pessoas como José Boaventura Malheiro de Carvalho, é termos um governo que elogia o que eles chamam de “Revolução de 64” e chamam assassinos e torturadores, tais como o Coronel Brilhante Ustra, condenado por tortura em seres humanos, de herói nacional. Algo me diz que vivemos hoje, numa democracia camuflada. Fica então a pergunta: em qual oceano ou cemitério clandestino podemos encontrar tantos desaparecidos, tais como José Boaventura Malheiro de Carvalho, cuja família ainda espera poder dar um enterro digno e cristão ao que lhe resta. Possivelmente essa será mais uma pergunta sem respostas.

Foto: Arquivo da família

terça-feira, 12 de novembro de 2019

“Exercícios de Partida (Metáfora Clandestina)” de Rogério Zola Santiago



Antes de ser o poeta, escritor e jornalista que é, Rogério Zola Santiago é, antes de tudo, um grande ser humano. Se hoje o escritor alternativo tem algum espaço em eventos mineiros, antes só aberto aos convidados consagrados, tais como a FLI-BH, deve-se a luta desse cara quando eleito Conselheiro Municipal de Cultura, no qual eu, que nunca havia saído de casa para votar em alguém, por não acreditar neste sistema, depois de dez anos realizando na capital mineira, o Belô Poético – Encontro Nacional de Poesia, evento este de reconhecimento internacional, sem apoio de nenhum órgão público, compareci a eleição dos conselheiros e votei nele. Foi a única vez que votei em Conselheiros Municipais de Cultura.
Agora Rogério Zola Santiago lança “Exercícios de Partida (Metáfora Clandestina)” (Páginas Editora). A obra, que traz um diálogo de diferentes linguagens e referências, apresenta diversos olhares sobre a morte e a vida. A meu ver, uma colcha de retalhos muito bem escrita, muito bem estruturada literariamente, trabalho esse que, segundo o autor, teve 30 anos de maturação e revisão. Em suas nuances, o autor consegue realizar uma inovação de linguagem, mas com a responsabilidade da licença poética a seu favor, numa obra envolvente, feita de memórias afetivas como sua matéria-prima. O livro com traduções em inglês de Lloyd Schwartz, ganhador do prêmio Pulitzer de Crítica, conta com fotografias e reproduções de obras de arte de artistas como Angela Geo, Ana Amélia Diniz Camargos, Enezila Campos, Eymard Brandão, Giuletta Santino, Inimá de Paula, Joana Scharlé de Vasconcelos, Márcio Zola Santiago e Yara Tupinambá, que dialogam com as memórias do autor. As fotos antigas estão emolduradas no livro, pela arte de Angela Geo.
Rogério Zola Santiago é Mestre em Comunicação (Jornalismo e TV) pela Indiana Univesity (EUA), crítico de arte, professor universitário, e autor de outras obras, como “Draga”, “Fragatas e Silêncios”, “Terra Brasilis” e “Tudo sobre a Falta de Educação”.
Segundo o autor em material de divulgação do livro: “Iniciei o livro em 1986, quando escrevi uma série de poemas em cima de um livro do João Cabral de Melo Neto. Há quarenta e três anos elaboro este lançamento. E parece que Deus perpetrou que eu passasse por perdas relevantes de entes queridos. Transformei as emoções dessas avarias em poesia, daí meus (nossos) “Exercícios de Partida.  (...)”
Alguns críticos, na parte "Diálogos", opinaram que a obra possui um aspecto didático, pois os poemas são acompanhados dos comentários a seu respeito.
Créditos das fotos: Juliano Moraes, Rogério Zola Santiago, Danilo Oliveira, Valdez Maranhão, Anna Castelo Branco e Ilana Lansky.
“O livro é pautado em fatos profundos retratando, entre outras, a história narrada pela professora da UFMG, Ione Grossi, torturada na ditadura. Assim como o assassinato da famosa modelo Ana Paulina, nos anos 70, que morava ao lado de nossa casa em um prédio que foi invadido pelos militares. Não têm como falar que não existiu ditadura. Perguntam como transformo estes fatos em poesia, mas, consegui. Minha poesia é prosa ritmada, mas prosa também pode ser poesia e, dessa forma, ocasionamos inovações. (...)”
“Exercícios de Partida (Metáfora Clandestina)” é um livro envolvente do inicio ao fim. Recomendo, com toda certeza.

sábado, 28 de setembro de 2019

25 ANOS DA MORTE DE SÉRGIO SAMPAIO, UM DOS GÊNIOS ESQUECIDOS DA NOSSA MPB



Maldito, por ser autêntico e não se vender a máquina musical, como o personagem da peça “Roda Viva” de Chico Buarque de Holanda, Sérgio Sampaio caso fosse vivo, estaria com 72 anos, neste 2019 em que se comemora 25 anos de sua morte.
Talvez um dos cinco mais importantes compositores brasileiros de todos os tempos, Sérgio Sampaio foi pouco valorizado quando ainda estava entre nós.
Nascido na mesma cidade natal do Rei Roberto Carlos, em Cachoeiro do Itapemirim\ES, em 13 de abril de 1947, Sérgio Moraes Sampaio, filho do maestro da banda de música e fabricante de sapatos Raul Gonçalves Sampaio (1900-1992) e da professora primária Maria de Lourdes de Moraes (1916-1990), teve infância humilde, na casa nº 65, da Rua Moreira. Na infância, ouvia no radinho de sua mãe, Nelson Gonçalves, Ademilde Fonseca e outros.
Suas composições passam por vários estilos musicais, indo do samba, choro, rock, blues e baladas. Em sua poética vêem-se elementos de Kafka e Augusto dos Anjos, que lia e apreciava. No dizer do cantor/compositor Lenine, Sérgio Sampaio foi um nome marginalizado que equipara a Tim Maia e Raul Seixas, como um dos malditos da Música Popular Brasileira.
No final de 1967, foi com a cara e a coragem para o Rio de Janeiro, tentar a vida como artista. Na cidade maravilhosa conheceu Raul Seixas, então produtor musical da CBS, que sentiu seu talento e lhe abriu as portas. Além de vários compactos simples e duplos, em 1971 participou de um disco revolucionário, ao lado de Raul, Edy Star e Miriam Batucada, intitulado “Sociedade da Gran Ordem Karvenista apresenta sessão das dez”, gravado quando os diretores da gravadora estavam viajando e retirado do mercado após a volta dos mesmos.
Em 1972, Sérgio ganhou fama nacional com a participação no Festival Internacional da Canção, com a marcha-rancho “Eu quero é botar meu bloco na rua”. Neste mesmo ano lançou pela Phonogram, o LP homônimo, que fez bastante sucesso. Em 1976 saiu pela Continental, seu segundo LP “Tem que acontecer”. De temperamento forte e difícil, além de boêmio inveterado, teve a portas fechadas pelas gravadoras, tornando-se mais um dos chamados popularmente de “malditos”. Em 1981, enquanto Erasmo Carlos comentava com amigos numa mesa de bar, sobre seu próximo disco cujo tema seria a mulher, Sérgio, já bastante embriagado, ouvia atentamente tudo. Semanas depois, procurou Erasmo e lhe apresentou uma nova composição intitulada “Feminino Coração de Deus”, uma das mais belas pérolas da nossa MPB, que foi prontamente gravada por Erasmo em seu disco.
Em 1982, financiado por amigos e pela família, lançou independente o LP “Sinceramente”, que teve pouca vendagem e boas críticas.  Com a falta de perspectivas, ganhou a vida fazendo esporádicos shows com a ajuda de amigos.
No começo de 1994, foi convidado pelo selo independente Baratos Afins para gravar um disco de inéditas, o que o deixou muito feliz. Mas às cinco horas da manhã do dia 15 de maio daquele ano, veio a falecer por causa de uma pancreatite, devido à vida desregrada a álcool em que vivia.
Em 1998 o compositor Sérgio Natureza produziu o CD “Balaio do Sampaio” com participações do próprio cantando “Eu quero é botar meu bloco na rua” e participações de Chico César, Erasmo Carlos, João Bosco, Zeca Baleiro, Zizi Possi, Lenine, João Nogueira, Eduardo Dusek, Renato Piau, Jards Macalé, Luiz Melodia e Elba Ramalho. Em 2005, Zeca Baleiro produziu o CD póstumo “Cruel”, com músicas inéditas.
Considerado um dos maiores gênios musicais da nossa MPB, Sérgio Sampaio está sendo redescoberto por quem aprecia o melhor da música brasileira. No livro “Eu quero é botar meu bloco na rua - biografia de Sérgio Sampaio” (Edições Muiraquitá-2000), escrito por Rodrigo Moreira, hoje raridade, mas que poderá ser encontrado nos melhores sebos do país. O escritor e jornalista Caio Fernando Abreu, numa crônica publicada em 24\07\1994 no jornal O Estado de São Paulo, definiu: “Sérgio era um pós-tropicalista, uma espécie de elo entre Mutantes, Tom Zé, e o que de melhor veio depois – Cazuza, Lobão, Ângela Rorô, Raul Seixas, que ele adorava, todos sofreram sua influência. Gravou três ou quatro LPs malditos, era rebelde demais para se sujeitar à caretice das gravadora. (...) Como Torquato Neto, é uma figura perfeita para ser ressuscitada, mitificada e, claro, vendida. No além, Sérgio vai rolar de rir...”
Hoje, Sérgio Sampaio é regravado por cantores que buscam suas canções.
E nas comemorações de 25 anos de sua saída deste mundo, nosso protagonista será fruto de um filme sobre ele pelo cineasta Hugo Moura, que há cinco anos pesquisa material para o documentário “Sinceramente Sérgio”, em alusão ao título do derradeiro disco do cantor, de 1982. A idéia é que o próprio protagonista conduza a narrativa, com músicas e depoimentos registrados em gravadores caseiros, que trazem reflexões existenciais, políticas e até sobre o corpo do compositor: “A magreza dele é um fato que chocava as pessoas e, nessas fitas que encontrei, ele comenta que era apenas uma questão de biótipo.” Comenta o cineasta Moura. “Tem muita coisa da década de 70 que vai surpreender os fãs. O Sérgio sempre foi um cara muito independente, que ficou meio de canto na música brasileira.” Afirma Moura. “Ele não se dobrava as vontades comerciais das gravadoras. Foi um cara meio cigano, que morou na casa de dezenas de pessoas. Em 1974, ele ganhou o Troféu Imprensa de revelação do ano e, até hoje, este troféu está num bar no Espírito Santo, porque ele deixou lá e nunca mais voltou para buscar.” Completa o cineasta.
Hoje, quem toma conta do espólio de Sérgio Sampaio é João Sampaio, filho único do compositor, fruto de sua relação de cinco anos com a arquiteta Ângela Breitschaft.
E quem quiser conhecer mais a fundo à genialidade de Sérgio Sampaio, é só buscar no yourtube o que há de melhor desse cara.



sábado, 3 de agosto de 2019

HELENICE MARIA REIS ROCHA - HOMENAGEM



Começou a escrever poesia aos 7 de idade. Declamava para as professoras do colégio os seus versos e escrevia no quadro negro também. Explicava para as professoras o que entendia que era linguagem poética. Foi seguindo assim até os 11 anos, quando começou a estudar pintura com o professor Claudionor Cunha, impressionista mineiro. Com 13 anos começou a estudar violão clássico com o professor Nelson Piló, assistente de Heitor Villa Lobos. 1964 explode o Golpe Militar.  Seu pai estava junto com a Sociedade Mineira de Concertos Sinfônicos, tocando o Concerto de Villa Lobos para harmônica e orquestra. Isto aconteceu antes dela conhecer estes mestres. Tinha 9 anos. O Professor Nelson Piló a preparou quatro anos para um concurso de jovens instrumentistas. Lhe deu para estudar uma peça de Anton Logy, que ele disse ser anônimo e ter produzido uma Obra Prima. 1975 entra na Faculdade de Letras da UFMG. Clima de medo. Se lembra de ter tentado assistir a uma palestra e a Universidade estar cercada por policiais. Em 81 foi eleita líder do Diretório Acadêmico. Apoiou a Quarta Internacional, que era trotskista e a OSI. Quebraram a Gráfica dos estudantes. Se tivessem encontrado textos da Quarta Internacional lá, poderiam ser todos presos. .Era clandestina. Passou alguns anos dedicada à Artes Plásticas. Fez Mestrado em Poesia. Apresentou vários trabalhos na ABRALIC. Publicou trabalhos teóricos e voltou à Poesia. Publicou em várias Antologias, no Brasil e no Chile. Sobreviveu quase sem recurso nenhum, junto à Sociedade Civil Organizada. Ainda sonha com um Projeto Socialista.
Mestre em Letras, Poéticas da Modernidade (UFMG). Especialista em Música, Educação Musical (UFMG). Cônsul do Movimento Internacional de Poetas Del Mundo. Cônsul da Associação Internacional de Poetas Del Mundo. Embaixatriz do Círculo de Embaixadores da Paz de Genebra. Membro Correspondente da Academia de Letras de Araraquara. Membro Correspondente da Academia de Letras de Teófilo Otoni.
Uma das autoras, junto com Biláh Bernardes, Irineu Baroni, Petrônio Souza Gonçalves e Rogério Salgado do livro “AI-5” (Baroni Edições – 2016). Participou de diversas coletâneas. Sua participação mais recente foi no livro: “Cem Poemas – Cem Mil Sonhos”, homenagem aos 50 anos de passeata dos cem mil, maior manifestação popular contra a ditadura militar no país, organizado por Rodrigo Starling.
Faleceu dia 31 de julho de 2019, deixando um vazio no mundo da poesia.

SOL

Eis que faliram os desígnios de morte
e a gota de sangue que batiza o cristal
se fez flor
Naqueles tempos tudo era sombra
Mas o sofrimento purifica
dizia meu pai
e Oscar Wilde também
não há prisões para o espírito
dizia meu pai
e ficávamos naquele escritório
docemente sombrio
fazendo Análise Musical
Bach, Stravinsk, Khulau, Zanetovich
presos, de madrugada
e livres
ninguém nos alcançava
desprezávamos os exércitos de loucos  

(Helenice Maria Reis Rocha)

Poema e foto: arte Biláh Bernardes